Ghost Interview
Warren Buffett 9.0
Ele dispensa apresentações e textos longos, afinal, sua visão sobre negócios é simples: invisto em tudo que consigo entender. O Ghost Interview da semana se preparou, colocou o terno, o perfume (e pegou um pedaço do bolo de Oreo feito por Bill Gates) e foi até Omaha para falar com ninguém menos que Warren Buffett.
E, o agora investidor da Apple e da Amazon tem uma visão mais acurada do negócio de tecnologia do que você imaginaria de um senhor de 90 anos que acabou de trocar seu celular de flip por um iPhone (sério, ele fez isto este ano)…
Warren, das muitas perguntas que poderíamos fazer ao senhor, seguimos a sua cartilha e começamos pela mais simples: afinal, qual a sua tese de investimento?
A chave para investir não é avaliar o quanto um setor vai afetar a sociedade, ou quanto vai crescer, mas sim, determinar a vantagem competitiva de uma determinada empresa e, principalmente, a durabilidade dessa vantagem. Os produtos ou serviços que têm “fossos econômicos” amplos e sustentáveis ao seu redor são os que proporcionam mais recompensas aos investidores.(Entrevista à revista Fortune em 22 de novembro de 1999)
Você pega esta tese e aplica a todas as empresas, ou tem algum tipo de limitação?
Investir de maneira inteligente não é complexo, mas está longe de ser fácil. O que um investidor precisa é a habilidade de avaliar corretamente negócios selecionados. Note a palavra “selecionados”: você não precisa ser um expert em toda e qualquer companhia. Você precisa conseguir avaliar as empresas dentro do seu círculo de competência. O tamanho desse círculo é muito importante; conhecer os seus limites é vital.(Carta Anual aos investidores da Berkshire Hathaway de 1996)
Esse “círculo de interesse” explica um pouco por que não investiu em tecnologia por um tempo, ou você acredita que empresas do setor não têm capacidade para criar a vantagem competitiva do “fosso econômico”?
O “fosso econômico” é valioso no mundo de tecnologia também se uma empresa desse setor consegue criá-lo. Eu só não senti confiança que eu era o melhor para julgá-lo em muitos casos.
Não era difícil saber quem estava ganhando em cada momento ou o que eram os seus negócios, mas existia um número muito maior de pessoas que sabiam mais deste jogo do que eu. E nós não queremos testar e ganhar num jogo que não entendemos. Nós contratamos algumas pessoas que entendem mais nessas áreas do que eu e Charlie [Munger, o sócio de Buffett na Berkshire Hathaway desde 1956].
Mas os princípios não mudaram. Algumas empresas antigas perderam o “fosso econômico” e surgirão empresas no futuro que serão enormemente valiosas. Nós esperamos conseguir identificar uma de vez em quando. Mas não será sempre… então é melhor nós ficarmos dentro da área em que entendemos o que estamos fazendo. (Apresentação Anual da Berkshire Hathaway de 2019, em 4 de maio de 2019)
Você é conhecido por ser um investidor de longo prazo. O quanto “longo prazo” significa para você?
O nosso horizonte de tempo preferido para manter uma posição é para sempre. Somos o oposto daqueles que correm para vender e realizar os lucros quando as empresas têm um bom desempenho, mas que se mantêm firmes em negócios que decepcionam. Peter Lynch costuma comparar esse comportamento a cortar as flores e regar as ervas daninhas.(Carta aos investidores da Berkshire Hathaway de 1988)
Warren, esta sua ideia do “círculo de competência” é boa, mas te deixou de fora de empresas como Google e Amazon por um tempo. A Amazon e a Apple a Berkshire Hathaway acabou comprando as ações, mas o Google ficou de fora. Por que deixou passar essas Big Tech?
Certamente olhamos para o Google e para a Amazon. E não pensamos nos termos se deveríamos ou não investir em empresas de tecnologia. Nós estávamos olhando para coisas que conseguíamos entender, no caso, a durabilidade da vantagem competitiva – e se a nossa opinião poderia ser melhor do que a dos outros para acessar essa previsão da durabilidade.
Mas a verdade é que eu olhei a Amazon desde o começo e eu acho que o que o Jeff Bezos fez foi algo parecido com um milagre. E o problema é que, se eu acho que algo será um milagre, eu tendo a não apostar nisso.
Seria melhor, muito melhor, obviamente, se nós tivéssemos alguns insights nesse setor. Mas, falando a verdade, Bill [Gates] me falou desde cedo, eu estava de olho na Altavista, ele falou que eu deveria olhar para o Google.
O problema foi que eu vi que o Google passaria o Altavista, e, então, eu me perguntei se não [surgiria uma outra empresa] para superá-los. Nós olhamos para isso [o Google], e eu errei ao não conseguir concluir que, no preço da época, os prospectos eram melhores do que o preço indicava.
(…) Mas, a verdade é que eu vou perder muitas oportunidades que eu não sinto que entendo bem o bastante.
Não tem penalidade em investir se você não acerta na “zona de strike”, contanto que você, em algum momento, acerte esta zona. Eventualmente você acha os pitches que gosta. E é algo que continuarei a fazer. Nós tentamos estar dentro do nosso círculo de competência.
(…) O que o Google fez foi muito impressionante. Eric, Larry e Sergey vieram falar comigo quando eles abriram capital. Mas eles estavam mais interessados em falar da abertura do capital e esses mecanismos.
E devo dizer que não é o negócio deles que era um mistério para mim. O mistério para mim era como a competição iria responder, como ela viria, e o quão eficiente eles seriam, e se este seria um jogo em que quatro ou cinco pessoas iriam batalhar sem fazer muito dinheiro quanto eles fariam se eles dominassem o mercado.
Não é sobre o número de competidores. Porque você pode ter indústrias que têm apenas dois competidores, mas eles se digladiam tanto que eles não conseguem se sair bem. É uma das questões nos negócios das companhias aéreas. No começo era um suicídio. Os fatores competitivos eram muito fortes nas companhias aéreas.
Mas eu digo que tomei a decisão errada com relação ao Google e à Amazon. Eu, eu ainda considero um milagre que eles tenham conseguido mudar o varejo e rolar com a AWS ao mesmo tempo. E isso sem uma grande quantidade de capital, com a eficiência e a rapidez que a Amazon fez.
Eu subestimei o Jeff. E eu já tinha uma opinião muito boa sobre a habilidade dele quando o conheci. Mesmo assim, o subestimei. (Apresentação na Berkshire Hathaway Annual Meeting de 2018, em 5 de maio de 2018)
Em 2016, a Berkshire comprou mais ou menos US$ 1 bilhão em ações da Apple, o que levou até mesmo o Tim Cook a falar que a empresa chegou num patamar diferente. Por que a Apple?
Eu não investi na Apple porque é uma ação de tecnologia, nem perto disso. Eu investi na Apple porque eu cheguei a certas conclusões sobre a inteligência com o qual o capital poderia ser usado, mas, mais importante, [cheguei a conclusões] sobre o valor do ecossistema e o quão permanente o ecossistema poderia ser, e quais eram as ameaças a estes ecossistemas.
Não precisou que eu abrisse um iPhone ao meio para saber como ele funciona. É muito mais sobre a natureza do comportamento do consumidor. E algumas coisas me parecem que têm mais permanência do que outras.
(…) Eu acho que eles têm um produto extraordinário e um ecossistema, e tem muito a ser feito, mas eu adoro a ideia de ter 5% ou qualquer fatia que seja – pode crescer para 6% ou 7% sem que a gente perca um centavo.
(Apresentação na Berkshire Hathaway Annual Meeting de 2018, em 5 de maio de 2018 – de acordo com os transcrições)
Quatro anos depois, a Apple, de fato, chegou ao valuation dos trilhões de dólares. Qual a sua opinião sobre eles agora?
Temos 5,5% da Apple hoje em dia e é provavelmente o melhor negócio que eu conheço no mundo. É o maior comprometimento que a nossa empresa tem, exceto nos setores de seguro e de trens. Então é o nosso terceiro maior negócio.
(…) Não vejo a Apple como uma ação, mas como o nosso terceiro maior negócio [da Berkshire Hathaway].
A Apple é uma empresa de bens de consumo que usa tecnologia. É uma empresa incrível que nós deveríamos ter apreciado antes.(Entrevista à CNBC em 24 de fevereiro de 2020)
Além de participação na Apple, vocês também têm papéis da IBM. Como vê uma empresa em comparação com a outra?
A IBM é um negócio completamente diferente da Apple. Para mim, a Apple não se parece mais com a IBM, mas começa a parecer a See’s Candies [fabricante de chocolates norte-americana]. Quer dizer, eles [a Apple] fazem um produto que é útil para as pessoas e que tem se tornado cada vez mais útil para elas. E as pessoas ficam envolvidas por este produto. É engraçado porque chamamos hoje em dia os iphones de smartphone, se você lembrar, o telefone já era um produto incrível e usável – mudou a vida dos meus pais, mudou vida de pessoas todos os dias. Eles criaram um aparelho que era muito caro no início, mas mudou o mundo. O smartphone faz parte da vida de milhões de pessoas no mundo em todos os aspectos da vida delas. Ele é usado para todos os tipos de utilidade, ou seja, é um bem de consumo. (Entrevista à CNBC em 24 de fevereiro de 2020)
Falando no iPhone ser parte da vida de muitos, neste ano, ele passou a ser parte do seu dia a dia. Você usava um celular de flip de menos de US$ 30 até hoje e trocou para o novo iPhone: quem te estimulou a fazer essa troca? E, quais apps você usa?
Foi o Tim Cook que me ensinou a usar. Fui até a Califórnia e ele passou, pacientemente, algumas horas tentando me fazer aprender a usar o iPhone – e me deixar no nível de uma criança de dois anos com o aparelho. E, vou dizer, que eu não cheguei a esse ponto.
Ele [Tim Cook] ficou algumas horas me explicando como usar, mostrou algumas utilidades do iPhone, ficou falando de apps, apps, apps… No final da conversa, eu falei “a propósito, o que é um aplicativo?”.
A verdade é que eu uso como telefone. Não uso nenhum app. Há alguns dias eu fiquei um pouco confuso na hora de fazer uma ligação e às vezes me confundo e não consigo atendê-las. As pessoas me mostraram os aplicativos, tem até um aplicativo em que eu apareço. (Entrevista ao Yahoo Finance! em 30 de abril de 2020)
Você chegou a comentar sobre como a Amazon fez um trabalho impressionante com a AWS. A Berkshire demorou, mas investiu na Amazon em 2019. Qual a sua visão sobre eles?
Eu fiquei maravilhado pelo talento gerencial do Jeff Bezos. Eu sou um fã desde que eles começaram. E quanto mais o vejo, mais impressionado eu fico com o que eles conseguiram. Principalmente em termos de monetizar o produto deles.
(…) Eu acredito que uma das coisas mais extraordinárias que podemos ver no mundo dos negócios é quando uma empresa de uma área – uma varejista, no caso da Amazon – consegue entrar e dominar uma outra indústria. Eles conseguiram ver futuro na nuvem, entraram no negócio e conseguiram uma liderança absurda. Eu vi uma entrevista do Jeff Bezos em que ele comentou que os outros players – todos pessoas com QI de 200 – deixaram a pista livre para ele por um ano, depois outro, sem investir no negócio de cloud. Não era um segredo que eles estavam desenvolvendo a AWS. Ele estava revolucionando a indústria enquanto as pessoas do setor, que poderiam ter feito o mesmo, ficaram sentadas olhando, basicamente.
(Entrevista à CNBC em 26 de fevereiro de 2018, um ano ANTES da empresa anunciar aquisição de ações da Amazon)
A falta de competição significante [à AWS] beneficiou muito a Amazon e a sua habilidade de dominar esta nova indústria. O Jeff achou que teria uma janela de dois anos na frente dos outros. Ele teve sete anos. Você [como competidor] não quer dar a Jeff Bezos uma vantagem de sete anos…(Entrevista à CNBC em 8 de maio de 2017)
Sua amizade com Bill Gates é bem conhecida! Tanto que falamos dela por aqui quando fizemos a Ghost Interview com Gates. Por que você não optou por investir na Microsoft?
Seria um erro para a Berkshire comprar a Microsoft. Exatamente por causa da minha amizade com Bill.
Se qualquer coisa acontecesse com a Microsoft uma semana antes, um mês antes, ações que pudessem alterar sensivelmente o preço da ação da Microsoft, como a empresa ter um resultado melhor que o esperado ou uma aquisição, iriam sugerir que eu soube da informação antes por causa da minha relação com Bill. Iriam acusá-lo de contar coisas antes para mim e vice-versa.
Eu tive oportunidades de comprar ações da Microsoft antes de conhecer o Bill [o encontro foi em 1991, a Microsoft abriu capital em 1986], mas nesse começo, eu só consigo falar que foi burrice minha mesmo.
Agora a Microsoft é uma das poucas empresas que estão na lista de empresas que não podemos investir por conflitos éticos. (Reportagem do Yahoo Finance em 6 de maio de 2018)
Além da IBM, da Apple e da Amazon, a Berkshire tentou comprar a TechData, empresa que foi comprada pelo Apollo Global no final do ano passado. Inclusive vocês ofereceram US$ 5 bilhões por ela. E, Warren, você não pode negar que é uma companhia de software e tecnologia, o que te interessou nela?
Eu li os resultados financeiros da TechData e as apresentações aos investidores e eu fiquei imediatamente interessado.
Era o nosso tipo de negócio. É um que conseguimos entender. Eu posso não entender os produtos que eles vendem, nem entendo o que os usuários que compram este produto fazem com ele, mas eu entendo a função de um intermediário de venda. (Entrevista ao Wall Street Journal em 29 de novembro de 2019)
Falando em compras de empresas, ou tentativas de, vocês também fazem muitas aquisições, qual a técnica de vocês para aquisição de empresas?
Nossa técnica de aquisição na Berkshire é a simplicidade em si. Nós atendemos o telefone. (Carta aos investidores da Berkshire Hathaway de 2000)
Suas frases são conhecidas pelo mercado (em tempo, amamos aquela que diz “invista num negócio que está indo tão bem que até um idiota poderia presidir, porque em algum momento, um idiota irá presidir”)Para fechar, e aproveitar a sua experiência e conhecimento no mercado, quais são as duas dicas que você dá para alguém que está começando a investir hoje?
Você precisa saber o que está lendo. Algumas pessoas têm mais aptidão para isso [contabilidade] do que outras, mas foi uma coisa que aprendi sozinho. Eu fiz cursos mais tarde, mas aprendi sozinho, e aprendi muito. Então, você precisa fazer isso.
Você [precisa saber que] está comprando uma parte de um negócio. Se você comprar de forma inteligente, vai ganhar dinheiro. Você precisa comprar algo que, na minha visão, você compraria se estivesse comprando um negócio, algo pelo qual você não vai receber uma oferta por cinco anos. Se eles fechassem o mercado de ações amanhã por cinco anos, você ficaria feliz em ser dono de uma parte da empresa como negócio.(Entrevista ao Yahoo Finance! em 2 de maio de 2020)
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