Ghost Interview
Um Zoom no CEO do Zoom
A gente pode dizer com algum grau de certeza que a ferramenta criada pelo entrevistado de hoje foi usada por todos vocês pelo menos uma vez nos últimos sete dias. Estamos falando do Zoom, ferramenta que possibilita a videoconferência de até 50 pessoas ao mesmo tempo! O Ghost Interview foi – virtualmente, lógico #isolamentosocial – atrás de, Eric Yuan, CEO e fundador do Zoom para bater um papo com ele sobre, bem, um pouco de tudo.
Seria errado da gente atribuir o sucesso do Zoom ao home office forçado de quase três quartos do planeta. A empresa de Yuan foi fundada em 2011 (e o produto foi lançado em 2013), se tornou unicórnio em 2017 e, no começo do ano passado, fez um IPO que a avaliou em um pouco mais de US$ 16 bilhões! Como essa startup conseguiu crescer em meio a Google e Microsoft? E o que eles veem do mundo pós-pandemia? É o que Yuan vai nos responder…
MORSE: Eric, como veio a ideia do Zoom, como foi o caminho até você fundar a startup sozinho e conta um pouco do começo das operações do Zoom.
Eric Yuan: Eu imaginei o Zoom pela primeira vez quando eu era calouro na faculdade na China e regularmente fazia uma viagem de trem de dez horas para visitar minha namorada (que agora é minha esposa). Detestava aqueles passeios e imaginava outras maneiras de visitar minha namorada sem viajar – esses devaneios acabaram se tornando a base do Zoom.
Decidi vir para os Estados Unidos no meio dos anos 90 por causa da internet, tecnologia que via como o futuro. Eu cheguei no Vale do Silício em 1997 e entrei na Webex, que, naquela época, era uma companhia pequena de colaboração em real-time entre usuários. A Webex cresceu muito rápido e abriu capital depois da minha entrada. Em 2007, a Webex foi comprada pela Cisco e eu me tornei o VP corporativo de Engenharia da Cisco, à frente dos softwares de colaboração.
Eu frequentemente conversava com clientes [dos softwares que liderava] e, teve um momento que eles passaram a me falar que não estavam felizes com as ferramentas de colaboração existentes no mercado, incluindo a Webex. Eu acreditava que conseguiria desenvolver uma plataforma que pudesse deixar esses usuários felizes então, em junho de 2011, eu decidi que era tempo de parar para criar essa ferramenta de comunicação em vídeo.
Mais de 40 engenheiros do meu time me seguiram nessa aventura. Lançamos o Zoom como plataforma beta em 2012.
Um fato engraçado desse começo de operação? Eu pessoalmente enviava um email para cada cliente que cancelava o nosso serviço. Um deles respondeu, acusando a empresa de mandar “e-mails automáticos” assinados pelo CEO. Eu respondi na mesma hora, indicando que era mesmo minha a mensagem e me ofereci para falar com ele via Zoom naquele mesmo instante. Nunca mais houve dúvida sobre o fato.
Fonte: Entrevista ao Thrive Global em 2 de outubro de 2017
MORSE: Já quando lançou o Zoom, o Google já tinha a ferramenta de Talks, bem como a Microsoft tinha o Teams. Como foi para vocês entrarem nesse mercado tão competitivo e qual foi o papel do Mobile nesse momento?
Eric Yuan: O mercado de videoconferências, de fato, estava muito cheio quando eu comecei o Zoom em 2011, e eu escutei isso de muitas pessoas. Muitos amigos e investidores me falaram que eu deveria evitar esse segmento. O negócio era que as ferramentas que existiam não estavam funcionando bem para os usuários, então não importava quantas empresas tivessem oferecendo seus produtos. O que eu aprendi é que vale a pena focar mais na experiência do consumidor do que no mercado quando se decide a iniciar um negócio.
Fonte: Entrevista a Steven Li, publicada no LinkedIn em 10 de julho de 2019
Eric Yuan: Um diferencial nosso foi que pensamos tudo Mobile First. Frequentemente quando o nosso time estava escrevendo um código ou programando, a gente se perguntava como tornar a experiência do nosso serviço a melhor possível no iPhone. A pergunta que vinha era se todas as features do iPhone estavam sendo usadas direito. E sempre pensávamos em como otimizar a experiência em cada device.
Antes de lançar o produto, a gente se certificou que a arquitetura dele suportaria a escala [o Zoom usa uma arquitetura auto-scaling de cloud]. O que significa que a gente já estava pronto para ter milhões de usuários desde o dia 1 porque a gente sabia que fazer isso depois de ter os usuários seria muito mais trabalhoso. Levamos dois anos para fazer isso, por isso a demora do lançamento do Zoom.
Fonte: Apresentação no Startup Grind em 13 de março de 2017
MORSE: Passando para o modelo de negócios: hoje em dia, o Zoom agora tem grandes clientes corporativos, mas não foi essa a tática de vocês sempre. Qual foi a construção e venda do produto para que ele tivesse espaço no mundo de Google e Microsoft?
Eric Yuan: Na verdade, começamos oferecendo serviços para micro e pequenas empresas, nos últimos cinco anos, acabamos migrando para também oferecer para grandes companhias. As companhias, principalmente as pequenas, estão procurando uma melhor forma de fazer videoconferência e oferecer um produto baseado em nuvem fazia sentido para elas.
Fonte: Entrevista à CNBC em 3 de fevereiro de 2020
Eric Yuan: Temos um modelo freemium. Os usuários podem ter uma conta de graça, mas pode usar até um limite. Então você pode ter até 50 participantes na reunião por 40 minutos se for de graça. Para muitos clientes, 40 minutos não é o bastante. Já o nosso modelo de assinatura teve sempre a premissa de ter um valor mais baixo exatamente para chamar atenção daqueles usuários que não conseguem pagar um sistema mais robusto e de uma empresa maior.
Pela natureza do nosso serviço, o usuário não pode usá-lo sozinho, é uma plataforma colaborativa. Você precisa que seus amigos e clientes usem também o programa. Assim, a gente começou a fazer o marketing para aqueles que eram convidados para as reuniões.
Além disso, nós também mapeamos aqueles clientes que já pagaram por 1, 2 ou 3 contas de uma mesma empresa. Para essas, a gente oferece outras soluções corporativas, com intuito de ser a ferramenta da companhia para conferências. Estabelecemos um contato com essas pessoas e o resultado tem sido positivo. Logo elas já têm entre 10 e 20 funcionários da mesma companhia como nossos usuários. Depois isso migra para todo o departamento.
Fonte: Entrevista ao site Cleverism em 17 de janeiro de 2016
MORSE: Você mesmo falou que a ferramenta foi feita para suprir demandas de trabalho, pensando em reuniões e até mesmo aulas online. Com a pandemia do Covid-19, no entanto, estamos vendo pessoas usarem o Zoom para fazer happy hour, festas e até exercícios físicos em conjunto… Como está percebendo essa migração?
Eric Yuan: Devo começar que, quando começamos, nós sabíamos que o futuro era a comunicação em vídeo, que o vídeo era a nova voz. Nós sabíamos que no futuro, especialmente os millenials e as gerações mais novas – teriam a flexibilidade de trabalhar de casa. Víamos o futuro como um lugar onde fosse possível se trabalhar de qualquer espaço, de qualquer device, a qualquer momento. Eu acredito que essa crise está sendo um catalisador desse movimento. Mas, para falar a verdade, nós nunca nem sonhamos com a migração ocorrendo nessa rapidez e por essa razão.
Historicamente, nós sempre estivemos focados no uso para o negócio. Mas sabíamos que, no final de semana, alguns dos nossos clientes usavam o Zoom para falar com suas famílias. Eram casos bem raros e esparsos.
Agora estamos vendo empresas que já utilizam nossa plataforma para reuniões, liberarem o uso para happy hour durante a semana. As empresas de tecnologia, inclusive, tem feito isso: Zoom de dia para comunicações de negócio e, à noite, para jantares virtuais, drinks em conjunto, happy hour…
Eu olho para as notícias e vejo pessoas usando Zoom para casamento, para encontros às cegas. Os usuários são muito, muito criativos, como estudantes. E nós nunca nem pensamos nesse tipo de forma de utilizar a nossa plataforma.
Fonte: Entrevista ao Silicon Valley Business Journal em 25 de março de 2020
MORSE: Você acha que esse momento de quarentena que estamos está mostrando um pouco de como será o futuro, no sentido de mais e mais pessoas trabalhando de casa?
Eric Yuan: Eu espero, de verdade, que essa crise acabe muito em breve, mas uma coisa que eu sei, com certeza, é que as empresas estão aprendendo uma nova forma de trabalhar [o home office]. E eu acredito que a maioria das companhias vão repensar seus modelos de trabalho e passarão a abraçar mais o home-office depois da crise. Anteriormente, muitos não queriam nem tentar.
Eu mesmo estou me adaptando à rotina de home office, tenho sentido falta dos almoços e percebi que tenho que fazer mais reuniões quando estou de casa. Mas estou me adaptando.
Fonte: Entrevista à Associated Press publicada pelo New York Times em 20 de março de 2020
MORSE: Nas últimas semanas, vocês ofereceram os serviços do Zoom de graça para algumas escolas de ensino fundamental pela Itália, Coreia do Sul, China e Estados Unidos. Esse era um uso que também não estava no plano do Zoom, mas como estão se adaptando, quais novas funcionalidades que devem lançar?
Eric Yuan: Uma das ferramentas que estamos trabalhando pensa nesse estilo de vida “em casa”, que são filtros para melhorar a luz do rosto e uma ferramenta de aulas online para professores. A primeira ferramenta é como se fosse no Instagram e no Snapchat, mas para a videoconferência. Recebemos feedback de professores e percebemos que podemos alterar o produto voltando para aulas, para deixar evidente todos os participantes da reunião – assim, o professor pode ver quem está prestando atenção. Assim como acontece na aula ao vivo.
Fonte: Entrevista à Forbes em 13 de março de 2020
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