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GHOST INTERVIEW #36 | A Mágica do Shazam!

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A Apple tem mudado muito, de empresa de hardware para companhia de serviços: criou um streaming de vídeos próprio pra entrar na batalha com o Netflix e está tentando fazer do Apple Music um grande Spotify. Bem, o Apple TV+ ainda não lançou, então o foco da Ghost Interview de hoje é a música, e, principalmente, os responsáveis por trazer a camada de entendimento de dados a esse serviço: o Shazam. O app foi comprado pela Apple no final de 2017 por US$ 400 milhões, uma das maiores aquisições da Maçã. Por isso, o entrevistado da semana é o cofundador do Shazam, Chris Barton.

Mais do que um app, o Shazam foi uma das primeiras empresas com DNA Mobile & Big Data que se tem notícia no mundo digital. Pensado para funcionar no celular, o Shazam foi criado em 1999 e começou a funcionar em 2002. Sim, o serviço já era uma aplicação antes mesmo de apps existirem! . Apesar da tecnologia estar pronta, a adoção só ocorreu mesmo depois que o app foi um dos escolhidos para estar na primeira lista de apps na estreia App Store do iPhone em 2008. Como eles se mantiveram em pé por tanto tempo e como eles chegaram à venda para a Apple 10 anos depois? Você lê aqui:

Qual é a música, Chris?!

A nossa ideia original da tecnologia era fazer com que as pessoas utilizassem o celular para identificar as músicas que estivessem tocando no ambiente, em qualquer localização. Como era 1999, os celulares eram bastante básicos; além de fazer ligações, o uso mais sofisticado desses aparelhos, na época, era instalar ringtones diferentes, mandar SMS, e, se você fosse muito ousado, poderia assinar um serviço que te enviava o placar de jogos via SMS. Lembrando que, em 99, o celular mais legal era o Nokia 8210, que era basicamente pequeno e tinha uma pequena tela em preto e branco.

Uma vez que inventamos o algoritmo, a gente percebeu que a nossa tecnologia não era exatamente para reconhecer música. Era muito mais uma “tecnologia para identificar sons gravados” e, de fato, isso poderia funcionar tanto para música quanto para shows de TV ou um ad, um filme, um programa de rádio. Por essa razão, a gente sabia que, em algum momento, a gente poderia expandir o uso do Shazam, mas a gente ainda acreditava muito no serviço de identificar a música como o principal para os usuários.

No nosso PowerPoint original de apresentação para os investidores, a gente falava que o serviço iria possibilitar que as pessoas comprassem música, assistissem a videoclipes, lessem as letras, mandassem as músicas para amigos, procurar quais músicas seus amigos estavam vendo e organizar as suas favoritas em playlists. Muitas dessas features são possíveis no aplicativo hoje, mas só conseguiram existir depois da criação das aplicações para smartphone, que foi muitos anos depois.

Quando estávamos começando o Shazam, os mercados Mobile mais avançados no mundo eram a Europa e o Japão. A Apple e o Google nem tinham começado a olhar para o Mobile. A Nokia era a toda poderosa dos devices. Enquanto nos Estados Unidos, as operadoras não tinham nem SMS interoperáveis, as telcos europeias já tinham serviços como “Premium SMS” como um mecanismo de pagamento mobile para third parties, como as companhias de ringtone. Se o Shazam fosse lançado nos Estados Unidos, nós, literalmente, não teríamos forma de gerar receitas. 

Na Europa, a gente podia cobrar os usuários pelo serviço de reconhecimento de músicas usando o Premium SMS. 

Quando nós lançamos, 95% dos britânicos que tinham celular – basicamente todo mundo com exceção dos clientes da Virgin Mobile – podiam, simplesmente, ligar para o 2580 quando escutassem uma música num bar, café, restaurante ou numa balada e colocar o telefone para “escutar” a música. Depois de 15 segundos, a ligação terminava e um SMS era mandado com o nome da música e do artista. Se não conseguíssemos identificar a música, não havia cobrança. Se o sistema conseguisse, então eram cobrados 50 pence [50 centavos de libra] na conta deles de celular. O serviço foi sempre chamado de Shazam. Depois de um tempo, a gente também habilitou a possibilidade das pessoas comprarem ringtones das músicas identificadas. A “segunda geração” do Shazam veio como aplicação Mobile, em BREW e Java, que tinha uma experiência mais rica, e, em alguns casos, habilitava o uso ilimitado por uma assinatura mensal de 3 dólares.  

O problema era que, sem milhões de usuários regulares, nossa receita não era o suficiente, então nós ficamos dependendo de funding de venture capital por muitos anos. Sem a experiência sem fricção das App Stores seria muito difícil de atrair milhões de usuários.

(Entrevista ao The Startup em 11 de novembro de 2015)

O número de usuários que a gente tinha do Shazam em 2002 até o lançamento do Shazam como aplicativo do iPhone, em 2008, era muito pequeno. Eram alguns milhares, não era um numero de bom tamanho para tornar o negócio viável e sustentável. Realmente, quando lançou a app store que a gente chegou num nível de crescimento exponencial, o lançamento foguete que começou a pagar as nossas operações. Diria que a companhia chegou muito perto de fechar várias vezes durante esse tempo, a gente estava apenas sobrevivendo. Tínhamos que ser criativos para fazer orçamento para os seis meses seguintes. Lembro quando tivemos que trocar de escritórios depois dos primeiros investimentos. Normalmente, quando empresa troca de escritório, vai para um lugar melhor, rola um upgrade. Não foi o nosso caso, a gente foi para um lugar menor e mais barato.

No começo do Shazam, construímos um negócio paralelo separado, nele a gente usava a mesma tecnologia do Shazam, mas para monitorar milhares de estações de rádio para reportar o que eles estavam tocando (e assim alimentar a nossa própria base de dados de músicas). Descobrimos que isso era necessário para várias empresas e instituições que distribuem os royalties para os artistas. Na época, eles ainda faziam isso manualmente, a gente ofereceu a nossa automação. Então podemos monetizar esse serviço, e até chegamos a vender essa parte do negócio para dar um pouco de gás para o Shazam.

Entramos na App Store por causa da ação de uma executiva nossa, que era muito persistente em fazer a parceria com a Apple, e firmou uma boa relação com eles. Na época, havia muito hype e pouca certeza sobre o iPhone, a gente não sabia se ele ia se tornar popular ou não, e a gente não tinha a escala ainda. Essa executiva nossa olhou a oportunidade de estar no iPhone antes, foi persistente, e acabamos sendo selecionados para estar na App Store logo que ela foi lançada.

Como a Apple também estava lançando um aparelho novo, ela fazia questão que os aplicativos que estivessem na App Store fossem um verdadeiro showcase para o uso do iPhone. Eles tinham a noção de que o iPhone só seria bem recebido pelo público e seria percebido como um device incrível se nele tivesse aplicativos realmente incríveis. Então eles olharam bem de perto o nosso desenvolvimento da interface do aplicativo. 

Foi incrível, finalmente perceber que o serviço que tínhamos pensado lá no começo da jornada tinha se tornado realidade. Oito anos depois. Nesses primeiros meses, eles tinham os rankings de apps mais baixados; na primeira semana, eu devo admitir que fiquei um pouco viciado em atualizar os rankings e ver o Shazam na lista de apps favoritos da App Store. Até hoje, ele continua dentro do top 100. Eu fiquei satisfeito.

Agora, uma curiosidade. Sempre fiquei obcecado em fazer com que o Shazam tivesse todas as músicas em sua base de dados. Acredito muito na importância da cauda longa. Deixar tudo acessível ao buscador foi parte importante do sucesso de empresas como a Amazon e o Google. Tornar tudo possível de buscar e comprar foi o trunfo da Amazon, e tem sido meu esforço no Shazam. Quando começamos, tínhamos 1,5 milhão de músicas na nossa base de dados, hoje temos mais de 40 milhões.

(Entrevista ao podcast From Scratch em 20 de junho de 2019)

Para essa, vou passar pra Cait O’Riordan, nossa VP de produtos de 2013 a 2016:

Cait O’Riordan: Quando alguém abre desbloqueia o telefone, entra no nosso aplicativo, aperta o botão azul, eles não estão apenas dizendo “qual é essa música?”, eles estão falando “eu gosto dessa música o suficiente para achar meu telefone, desbloqueá-lo e apertar o botão azul”. O uso do aplicativo é um statement dos gostos da pessoa, e isso, quando aplicado na escala que temos – com milhões de usuários ativos mensais e diários – significa que temos um grande datapoint em nosso sistema. E nós passamos bastante tempo olhando para esses dados e interpretando o que eles representam para a indústria musical. Com precisão relativa, nós conseguimos prever quais músicas irão para o número 1 das listas da Billboard (de mais escutadas) nos Estados Unidos com um pouco mais de um mês de antecedência. 

No nível mais básico, a gente consegue achar quais são as músicas mais populares. A gente consegue entender como um hit se comporta, e consegue entender qual o ciclo que ele tem até chegar ao topo da lista de mais tocadas da Billboard nos Estados Unidos.  

Nós conseguimos, até dizer pelas primeiras horas desde o lançamento se a música será ou não um sucesso. Desde as primeiras horas, no final de 2013, quando Katy Perry e Lady Gaga lançaram os seus singles de álbuns muito esperados e com bastante marketing envolvido, Roar foi mais pesquisada que Applause, deu para ver que era um hit maior. E foi o que aconteceu. 

Cruzando a localização, conseguimos saber quais músicas estão fazendo sucesso nas casas noturnas antes mesmo de elas chegarem no rádio ou na TV. Temos uma lista e análise apenas para isso. 

Nós até mesmo conseguimos dizer qual é a parte que mais faz sucessos de uma música: o começo, o refrão ou o final. Quando as pessoas pesquisam mais no começo, nos primeiros 10 segundos, é uma indicação forte de que a música será um hit.

(Apresentação no Strata+Hadoop World 2015 em 6 de maio de 2015)

Rich Riley, ex-CEO do Shazam: O Shazam quer conectar as pessoas ao mundo em volta delas. Além da música, TV, estaremos ao vivo no cinema, Shazam como pré-show, lançamos Shazam para o rádio recentemente, onde as pessoas podem pesquisar por conteúdos e ads que estão tocando no rádio pelo aplicativo, e também lançamos para o varejo, para ambientes de varejo. São formas de fazer o aplicativo conectar as pessoas ao ambiente e de criar experiências contextualizadas. 

(Entrevista à CNBC em 21 de outubro de 2014)

Eu não poderia estar mais feliz com a operação. Quero dizer, obviamente, a Apple é uma empresa que tem focos parecidos com o Shazam. E eles são um grande player na música, lado a lado com o Spotify, e já foram o líder global em música digital antes dos streamings, com o iTunes. E, em geral, eles têm um negócio complementar ao Shazam.

A aquisição da Apple foi um processo longo, de mais de um ano. Parte disso por causa de toda a regulamentação, hoje em dia, a União Europeia tem olhado com mais atenção para aquisições de grandes companhias como o Google, a Amazon, o Facebook e a Apple. Durante o processo, nós tivemos grandes conversas com vários prospectos e empresas que poderiam ter comprado o Shazam. Mas, definitivamente, eu não poderia nem sonhar com uma saída melhor do que essa.

Nós fomos um grande driver para as vendas afiliadas do iTunes e fizemos muitos negócios em conjunto com a Apple, estivemos primeiro em novas tecnologias da Apple como o iPad e o Apple Watch. Então, como fundador, é bom ficar perto e obter algum nível de interesse ou até mesmo ofertas potenciais para a sua empresa. Isso não significa que precisa mergulhar fundo e levar todas essas ofertas a sério, mas é bom estar ciente delas. 

Eu acho que a venda do Instagram foi, basicamente, o Mark Zuckerberg cortejando o Kevin Systrom, por um longo tempo, o que levou a uma aquisição significativa. 

Sobre a segunda questão, sim, é uma pergunta que sempre escuto e eu sempre penso que não sou uma das melhores pessoas para respondê-la, uma vez que eu tendo a ser empreendedor e tenho tendência a escolher áreas e dar o zoom nessas grandes áreas, não sou como os investidores que são mais generalistas e ficam mais atento a tendências.

Então, devo dizer que não sou a melhor pessoa para dar a resposta, mas, já que preciso dar, vou falar que a área que eu estou particularmente fascinado, em termos de impacto massivo, é a de inteligência artificial e de machine learning, que, obviamente, são duas grandes tendências.

Eu acredito que, uma a uma, as empresas serão significativamente impactadas [pela inteligência artificial] o que deve criar oportunidades para novos produtos, novas startups e por aí vai. Negócios que resolvam os problemas bem, apenas utilizando essas tecnologias. Então, definitivamente é uma categoria que trará transformações nos próximos anos.

Mas eu acho que haverá uma a uma várias empresas que serão significativamente impactadas e até mesmo criarão oportunidades para novos produtos, novas startups e assim por diante, que resolvam problemas realmente através do emprego de inteligência artificial e aprendizado de máquina. Então, essa é definitivamente uma categoria que me deixa muito animado e acho que vamos criar uma mudança significativa nos próximos anos.

(Entrevista ao podcast Startup Exits em 17 de abril de 2019)

Machine learning está fundamentalmente mudando a maneira como os computadores fazem tarefas difíceis. Os aplicativos são, simplesmente, um tipo de experiência do usuário onde os consumidores podem interagir diretamente com computadores, tanto do telefone quanto na nuvem. Com a maturidade do machine learning, nós podemos esperar novas features e capacidades para os aplicativos móveis, que poderão facilitar a nossa vida, deixarão o computador resolver os problemas, automatizar tarefas. Nós podemos esperar quase tudo com esse novo poder, desde novas personalizações até navegação em tempo real.

(Entrevista ao London Speaker Bureau em abril de 2019)

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