Ghost Interview
GHOST INTERVIEW #43 | O business do Fortnite
Nesta semana, o game mais popular do mundo saiu do ar por um dia para, ontem, lançar sua nova versão, deixando um pouco mais de 250 milhões de usuários espalhados pelo mundo completamente desolados. Está achando pouco? E se a gente disser que, só em 2018, só esse game faturou US$ 2,5 bilhões? E que, neste ano, fechou parceria com marcas como Nike, NFL e Marvel. Interessou? Que bom, porque o Ghost Interview da semana é com Tim Sweeney, CEO da Epic Games, “dona” do Fortnite.
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Se tem alguém entende da diferença que o Mobile faz para um negócio esse é Sweeney, fundador da Epic Games lá em 91, chegou a vender jogos em disquete para computadores. Nos anos 2000, eles foram responsáveis pelo Gears of Wars, game de sucesso voltado para XBox e para Windows. O mercado, no entanto, mudou rápido, e Sweeney vendeu 48,4% da Epic Games para a Tecent, a chinesa dona do WeChat, enquanto mudava o negócio da companhia para o “Game as a Service”. Então veio Fortnite. O game criado num hackaton para ser um teste da plataforma da Epic foi lançado em 2017 no modelo pago. Meses depois o Mobile forçou a mudança para o freemium. O resultado está nos números do primeiro parágrafo. Acompanha essa história:
Foi muito menos por inovação e mais por necessidade de dinheiro. A cada mudança nossa, a gente reconhecia que o negócio que a gente operava estava no limite do que a indústria de games conseguia suportar.
No final dos anos 90, a Epic começou a fazer grandes games de PC, com budgets “sérios”. Essa era acabou quando a pirataria [de jogos de PC] impactou o mercado e tornou a venda de jogos de single player impossível. Estimo que, nessa época, para cada jogo que a gente vendia, quatro cópias piratas eram feitas. Então entramos no mercado de consoles, com ajuda da Microsoft. O primeiro Gears of War foi um tremendo sucesso: ele custou US$ 12 milhões para desenvolver e fez mais ou menos US$ 100 milhões em receita. No final do ciclo, já no terceiro Gears, os custos já foram quatro ou cinco vezes maiores do que o lucro.
Isso foi o que nos empurrou para se movimentar e mudar de modelos de negócio. Ajudou que a gente tinha um projeto para lançar um jogo multiplayer com novos conteúdos. Quando chegamos para a Microsoft para dar essa ideia, eles negaram. Nós não estávamos pedindo por dinheiro, mas, como eles eram os nossos publishers e os donos do Xbox, esse tipo de game não cabia nos planos deles, então negaram. Isso me mostrou de maneira muito clara que havia um risco enorme em se ter um publisher ou qualquer um no meio dessa cadeia de gamers e desenvolvedores.
Novamente, teve aquele momento de perceber que o modelo antigo não estava funcionando mais e que o novo modelo seria o caminho a se seguir. Nós estávamos vendo os games mais incríveis da indústria sendo construídos como live games. Reconhecemos que o papel ideal da Epic na indústria era ajudar nisso, por isso começamos a transição de só operar em apenas um console para ser multi-plataforma e um self-publisher.
Para isso funcionar, tivemos que recorrer a algo que nunca tínhamos feito: pela primeira vez nós trouxemos um investidor externo, a Tencent, que colocou dinheiro na companhia e também nos deu uma série de conselhos úteis.
A Tencent é muito rápida em nos apontar os números do mercado, como estava o mundo dos games na China e os números de três empresas digitais do mundo. Eles não são desenvolvedores de game. A expertise deles é em como operar os jogos em grande escala e como ter um bom apelo junto com os usuários, e nós descobrimos que esses são valores muito similares aos nossos.
(Entrevista dada à reportagem “Their future is Epic: The evolution of a gaming giant” da Polygon, de maio de 2016)
Quando os smartphones foram lançados, todo mundo começou jogando games casuais como o Angry Birds, mas com o tempo, a maioria das pessoas acabou se entediando dessas experiências, e foram atrás de games melhores – uma grande leva de pessoas deixou de ser gamer casual no Mobile. Eles migraram para se tornar gamers “core”, que esperam experiências melhores e mais interessantes no celular.
Essa transição toda, na verdade, aconteceu na Coreia do Sul há uns três anos. Desde então, a maioria da indústria de games Mobile já faz jogos sérios voltados para gamers mais experientes – os “casuais” existem, mas são minoria. Isso aconteceu enquanto o gosto e o comportamento das pessoas mudaram.
Estamos no momento da transição, já que esses jogos que vieram do PC e dos consoles ainda estão no topo das listas de mais baixados no Mobile. Mas, até o fim desse ano, você vai ver que a maioria dos games sérios feitos 100% no Mobile estarão no topo dessas listas e vão ficar lá por muito tempo. Eu acho que o futuro é Mobile e isso não vai mudar.
Existe uma nova geração de gamers crescendo com expectativas diferentes. Você lembra quando lançaram o Halo, que foi um grande game de tiro para console, todos os gamers de PC olharam e falaram “o controle não é tão bom quanto o mouse e o teclado”. Para falar a verdade, se você está crescendo e aprendendo a jogar em um espaço diferente, é natural.
Acho que [com o Mobile] as pessoas agora estão percebendo que os games, especialmente os multiplayers, são experiências sociais e o hábito dos usuários nesses jogos se parece com o de uma rede social.
(Entrevista ao MCV em 25 de maio de 2018)
Tem um valor real nisso. Se você observar por que as pessoas são pagas para fazer as coisas, é porque elas estão criando um bem ou prestando um serviço valioso para alguém. Há tanto potencial para isso nesses ambientes virtuais quanto no mundo real. Se, ao jogar um jogo ou fazer algo no mundo virtual, você estiver melhorando a vida de outra pessoa, poderá ser pago por isso.
Precisamos começar a repensar a maneira como estruturamos essas economias de jogos em larga escala, especialmente à medida que elas se tornam maiores e mais complexas. Esses espaços não devem ser simplesmente um meio para o desenvolvedor extrair dinheiro dos usuários. Deve ser uma coisa bidirecional da qual os usuários participam. Alguns pagam, outros vendem, outros compram, e há uma economia real.
Se você observar o que a Valve fez com o CS: GO e outros jogos, eles têm uma economia vibrante. Muitas pessoas ganham a vida nesses jogos. Quando você compra algo, não está comprando apenas da Valve. Você costuma comprá-lo em um mercado aberto de outro vendedor. É uma economia muito complexa. Há muito potencial nisso. Precisamos avançar em direção a um modelo como esse para podermos escalar algo como um metaverso.
(Entrevista ao GameBeat, do VentureBeat em 30 de agosto de 2017 – dada antes da mudança do Fortnite, diga-se de passagem)
Nós distribuímos o Fortnite para usuários do Android diretamente no nosso site. Sem nenhuma loja ou terceiro envolvido. Exatamente como a experiência do PC ou do Mac.
Fizemos isso por duas razões. A primeira é que a gente quer ter um relacionamento direto com os nossos usuários em todas as oportunidades que tivermos. Em plataformas abertas como no PC e no Android, é possível fazer os usuários baixarem diretamente da gente. Podemos estar em contato direto com ele sem um distribuidor mediando esse negócio.
A segunda motivação foi financeira e está ligada ao ecossistema atual das lojas de aplicativo. Geralmente, há uma divisão 30/70 e, dos 70%, o desenvolvedor paga todos os custos de desenvolvimento do jogo, operação, marketing, aquisição de usuários e tudo mais. Para a maioria dos desenvolvedores, essa conta não fecha e a receita acaba perdida. Ao colocar o nosso aplicativo diretamente para os usuários é mais eficiente economicamente falando. Isso significa que o aplicativo vai direto para o celular, e o pagamento [dentro do app] é feito via Mastercard, Visa, PayPal e outras opções, mas que não cobram 30%.
[O funcionamento das app stores] É uma crítica geral que eu tenho para as plataformas de smartphone hoje em dia.
Sobre os pagamentos, cabe a nós tornar a operação [dentro do app] o mais simples possível. É um jogo gratuito que qualquer pessoa pode baixar, e a única forma da gente ganhar dinheiro com ele é se os usuários amam o game o bastante para comprar coisas nesse ambiente.
(Entrevista ao GameBeat, do Venture Beat, em 3 de agosto de 2018)
Nós já tínhamos construído a plataforma muito antes de ter um negócio apoiando a loja. Na verdade, foi a plataforma para o Fortnite, que acelerou tudo ao trazer uma audiência enorme de gamers engajados, usuários essenciais para o sucesso de um lançamento de uma loja. A audiência grande também é muito importante para dar escala para o modelo de share de receita de 88/12 que estamos apoiando e praticando na loja.
Outras lojas de plataformas abertas têm sido devagar para responder [a esse preço] até agora. A Ubisoft, por exemplo, já optou por colocar alguns de seus jogos na nossa plataforma.
A loja que está online hoje ainda é uma versão reduzida do que queremos que ela fique. Estamos trabalhando com desenvolvedores da indústria para identificar bons títulos para vender na Epic Games Store. Nessa fase inicial, estamos começando com um número pequeno de games selecionados com cuidado.